O lugar de fala


Recentemente leio e ouço uma grande frente evocando o “lugar de fala” como um espaço em que eu tenho direito de falar porque tenho experiências que legitimam a minha fala. Frases como “eu tenho voz” e “minha voz foi silenciada” são tão frequentes quanto o desprestigio corriqueiro de pessoas que não compartilham a mesma experiência que possuo.
“Eu falo, eu tenho voz, eu tenho direito de falar e se você discordar você está errado porque você não faz parte do meu lugar de fala”. Sinceramente isso soa, como diria uma amiga querida, como um monologo.
Lembro-me de uma experiência na faculdade, caminhava com uma professora, que é uma grande fonte de inspiração em minha vida, para tomar um café e uma menina do movimento feminista da universidade nos parava e pedia que nós assinássemos um abaixo assinado contra a violência da mulher para participarmos de uma palestra informativa. Essa professora parou e perguntou: “os homens podem assinar isso?” e ela nos disse que não, que era só para mulheres assinarem e assistirem. Obviamente não assinamos.
Essa concepção de “lugar de fala” me lembra claramente esse exemplo: uma radicalização dos valores pela inversão. Inverto os sinais e os oprimidos viram os opressores.
Mulher só fala de mulher, negro só fala de negro e quando se pergunta “Como trabalharemos a empatia nesse movimento? ”, dizem para nós que se trabalha a empatia no “lugar da empatia”, mas nunca assumindo a voz de ninguém, porque todo mundo tem sua experiência.
Não vejo mais inverossímil discurso. Não existe um lugar mítico que me ponha em uma posição privilegiada. Lugar é um conceito geográfico, aceito lugar de fala espacialmente falando, agora um lugar mítico que me ponha em uma situação privilegiada para falar, isso não. Como vou vencer a opressão sem falar com os opressores em potencial? Fechar em redomas não resolve problemas, cria-se mais um.
Mas há uma alternativa, que tal em vez de pensarmos em “lugar de fala” pensemos em “lugar de troca”? A minha experiência e a sua criam uma nova, porque como diria a professora citada acima, nós não precisamos dar voz, precisamos dar ouvidos. E acrescentaria que precisamos nessas escutas ativas criar conexões uns com os outros.

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